sábado, 11 de abril de 2009

Carlos Lúcio Gontijo- Elias Maboub, o cavaleiro de Damur




Imagem:detalhe de desenho(Clevane Pessoa)
Dente de leão.
O Presidente da Associação Mineira de Imprensa em Belo Horizonte(AMI),Wilson Miranda, envia-me, a meu pedido, esse artigo do jornalista Carlos Lucio Gontijo e a foto de Elias Maboub.

O perfil dessa pessoa assim interessante , chega-nos recheado de fatos hitóricos, datas, situações provavelmente desconhecidas para os mais jovens, principalmente:comove-nos, por exemplo, a expulsão de uma pessoa vocacionada para a Medicina , apenas por sua origem - e ainda se diz que o Brasil jamais foi xenófobo.Em que pese a constatação de que Governos em geral, não sabem o que o povo precisa , aprova, rechaça,verdadeiramente.Comove-me a observação de que para estar mais perto de seu real chamamento - o "vocare" motivador- o amigo do autor passa a trabalhar "como vendedor de remédios".Quando trabalhei no INAMPS, lembro-me de algumas pessoas que, por motivos financeiros não pode ser médico e então,tentava realizar-se ao passar para os "doutores", com gentileza e perspicácia, a enxurrada de treinamentos recebidos das empresas farmacêuticas.À frente do tempo, trazia aos médicos, as novidades das drogas legais, recitava as benesses do medicamento, desfiava os efeitos colaterais, e apertava sorridente, as mãos de quem o ouvia.As multinacionais , então, treinavam seus representantes com pacotes de oratória,comunicação, gramática.Todos muito bem vestidos, a exalar um ar de prosperidade...
Elias Maloub, o estrangeiro, domina a Língua Portiguesa, o que é ponto de partida para que se tornem grandes companheiros.
Linda narrativa de amizade. E é gratificante saber de um amigo que quer manter ,chama votiva acesa, a história do outro, "para que não se esgarce/nos horizontes longínqüos"(*).

A estilística de Gontijo é de fácil leitura, mas traz a densidade da vivência a fundo, aquele "De Profundis" necessário a todos que escrevem, para que suas palavras não soem quais pseudo-afirmações - e que, no entanto, é privilégio de uns poucos.

Leiam, para conhecer sobre esse cavaleiro de Damur.

Clevane Pessoa de Araújo Lopes
Diretora Regional do InBrasCi (Instituto brasileiro de Culturas internacionais)em Belo Horizonte.
Embaixadora Universal da Paz-Círculo dos Embaixadores Universais da Paz, por Genebra, Suiça.


Elias Maboub, o cavaleiro de Damur


Carlos Lúcio Gontijo







A imensa maioria das pessoas costuma nos cobrar pedágio para que delas
nos aproximemos. Precisamos nos derreter em mesuras para lhes chamar a atenção
e, assim, iniciar os primeiros passos na construção de uma amizade. Todavia,
com o afável e honesto Elias Maboub, não era assim. Eu o conheci na década de
70, trabalhando em departamento de revisão de jornal, num tempo em que veículo
de comunicação impressa se interessava pela propagação de uma língua
portuguesa/brasileira correta, auxiliando na formação da cultura linguística de
seus leitores.

Elias Maboub logo me chamou atenção por seu inegável e profundo
conhecimento de gramática. Libanês nascido em Damur (a 9 de fevereiro de 1924),
uma cidade litorânea que não existe mais, destruída que foi por sírios e judeus
que ali, em território alheio, tentavam resolver, por meio da luta armada, suas
idiossincrasias movidas pelas incompreensões e desentendimentos mundanos.

Maboub veio para o Brasil com dois anos de idade seguindo seus pais e se
transformou no mais autêntico e legítimo brasileiro que poderíamos (e podemos)
imaginar. Experimentou os prazeres proporcionados pela riqueza por intermédio
da negociação de café exercida por seu pai; depois sofreu as dores da derrocada
com a chegada de crise econômica que fez sucumbirem as finanças do pai, que pouco falava português e mal anotava os vários negócios feitos "no fiado", sob a confiança de que receberia os créditos. Entretanto veio a débâcle, com ela o sumiço dos devedores.

O amigo Elias Maboub era detentor de extrema vocação médica, o que o
levou a fazer vestibular e frequentar o curso de medicina durante dois anos,
até que um dia o governo brasileiro, em acesso de arroubo nacionalista, decidiu
pela expulsão de todos os alunos considerados estrangeiros das universidades, o
que tanto interrompeu quanto pôs fim a seu sonho, levando-o - talvez para
manter proximidade com a área médica - a trabalhar como vendedor de remédios
para inúmeros laboratórios.

Pois bem, pouco tempo depois de conhecer Elias - pai extremoso e esposo
exemplar - , ao qual aprendi a chamar carinhosamente de "Tio Elias", deu-se a
criação do IV Turno de Revisão no jornal Diário da Tarde, que nos deu a
oportunidade de formar, não apenas um quadro de jornalistas profissionais de
revisão, mas, sobretudo, uma família. Eu comandava a turma, e Elias sempre me
substituía durante as minhas férias anuais. Pelo menos uma vez por semana,
terminada nossa jornada de trabalho, saíamos madrugada adentro, de bar em bar:
era um companheiro no violão e voz, outro no batuque e todos na cantoria regada
a cerveja, conhaque, uma boa pinga, torresmo, vaca atolada, e caldo de mocotó
(aos quais Elias acrescentava pimenta aos montes) - tudo banhado e embebido na
luz de um mar sem fim de amizade, respeito mútuo e camaradagem.

O tempo passou. De repente, fecharam o nosso IV Turno, revisão passou a
ser coisa desnecessária e supérflua, cada um de nós foi remanejado para
determinado canto. E Tio Elias terminou seus mais de 50 anos de jornalista
profissional de revisão como uma espécie de controlador de qualidade, lendo o
jornal depois de pronto, com o objetivo de apontar erros graves, função que,
apesar de todo o seu esforço, não era levada a sério, pois os erros eram
repetidos numa corrente interminável.

Então chegou o dia em que Elias Maboub, depois de tantos anos de trabalho,
resolveu encerrar sua labuta profissional. Dia 15 de julho, a data. Assistindo à
angústia do amigo, tomei a iniciativa de lhe comprar uma caneta, mandar gravar a
data e escrevi, emocionado, um cartão carinhoso. Elias me abraçou aos prantos,
enquanto eu tentava consolá-lo sob a sombra da inequívoca frieza empresarial,
que transforma o trabalhador em simples número.

O cavaleiro de Damur, Elias Maboub (nome que registrei em um personagem de
meu romance "Lógica das Borboletas"), cavalga agora, desde 27 de março último,
nas planícies do Senhor. Sinto e sempre sentirei a sua ausência física, mas
perceberei sua presença espiritual em minhas noites de autógrafo às quais ele
sempre prestigiava; lerei mental e invisivelmente o cartão de Natal que ele me
enviava todo ano; ouvirei seu telefonema por meu aniversário. Em resumo,
restou-me, como ato final, transferir o número de seu telefone para as páginas
da agenda do meu coração, pois virá o tempo em que também serei peixe na rede
celestial, e eu lhe ligarei: "Tielias", estou chegando!

Carlos Lúcio Gontijo

Naveguem até ao site do autor, a quem ofereço o poemeto abaixo,simples mas veraz.:

www.carlosluciogontijo.jor.br

Para ver a galeria de fotos de lançamentos , do autor e seus convidados,vá até

http://www.carlosluciogontijo.jor.br/galeria.html

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Poemeto da Amizade





A amizade tem sutilezas de vitral:
técnicas e arte,unidas à luminosidade do sol,
filtrada em harmonia,perfeita integração.

A amizade tem sutilezas de cristal:
sete cores decompostas de um branco primário.

Faz-se das artimanhas do coração
explica-se sem nenhuma explicação
e deve durar sempiternamente,
porque quando se acaba...amizade não é, não!

Clevane Pessoa

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